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Adeuses: uma árvore vale mais do que mil cavalos

  • Foto do escritor: João Rosa de Castro
    João Rosa de Castro
  • 11 de fev.
  • 2 min de leitura

Convém reiterar a importância do livro Adeuses na história da literatura e da poesia brasileiras. É obra que nunca poderá passar em brancas nuvens. Fala da inquietação inata da humanidade, que aliás está mais do que presente, não apenas neste, mas na maioria dos livros do autor.

Em Torre Central, imagina-se um edifício muito alto e sublime, no qual a persona desenvolve algum trabalho intelectual. Se sai ouro e entra unguento, trata-se da desigualdade no Brasil, que até hoje entrega o que tem de mais valioso em troca de bagatelas. Por estas e outras é que ela insiste em dizer adeus.

Aqui nA Viagem, poema dedicado a Frans Krajcberg, artista que expõe, entre muitas outras, instalações com o tema das árvores, instalações e artes visuais em geral, o autor tirou de si um poema pinturesco falando a história de uma árvore que, arraigada na terra, depois de ouvir os planos de viagem dos pássaros, finalmente insiste em partir para dentro de si mesma, dizendo mais um adeus.

Do tempo em que João Rosa se entretinha com o tropicalismo, surgiu o poema O Choque de Agripino, uma evocação de força, sucesso e inspiração ao colega romancista, enquanto ele vivia.

Poema de Oito Faces tem uma afirmação de Jean-Paul Sartre, com a qual a música ao menos discordaria facilmente: “não existe harmonia entre dois seres.”. A frase foi lançada no poema sem muito contexto, apenas dizendo ser arriscada, porque o poeta adivinhava que uma orquestra sinfônica tem harmonia deveras, e a harmonia é parte constituinte da música. Se não houvesse harmonia entre dois músicos, onde haveria? Em três ou mais? Para saber hoje o que o filósofo queria dizer com isto, seria necessário uma imensa pesquisa.

Finalmente em Poema de Amor, o autor faz uma ironia contra aqueles que acreditam que a máquina será um dia capaz de fugir ao controle dos homens e fazer coisas que eles não querem, sem depender deles ou da natureza. Ideia estapafúrdia. Vê assim:

 

POEMA DE AMOR

 

A máquina do metrô se apaixonou;

Foi por isso que então me confessou,

Mesmo que eu não fosse confessor.

Mas ela é que achou que eu fosse honesto,

Honesto, sim, porém não sou um túmulo.

A máquina do metrô da mesma forma

Contou-me tudo para que reencontrasse

O seu amor que há muito ela não via.

Ele, dizia, é o amor por que fui feita.

Enfia-me as notas com candura.

Aperta os meus botões com uma presença,

Que me deixa assim extasiada.

As digitais do homem já conheço

E sinto o seu perfume à distância.

A máquina do metrô disse que era

Grande como as grandes mulheres:

Entre centenas de homens já sabia

Por qual deles podia se apaixonar.

 

[In: CASTRO, João Rosa de. Adeuses. São Paulo]
 
 
 

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