Fogo Fátuo: mil poemas de poeta algum
- João Rosa de Castro
- há 12 minutos
- 3 min de leitura

Quantos poemas um sujeito precisa ter escrito para ser considerado poeta ou escritor?
Para responder esta pergunta são necessárias algumas considerações, a saber: o que é um poema, e verificar se as qualidades do poema estão na maioria dos poemas escritos pelo sujeito; saber o que é escrever, porque um elefante pode escrever por instinto ou impulso ou adestramento, um infante pode escrever por acidente e nem um nem outro poderá ser considerado escritor; e verificar ainda o que é ser um escritor.
“Um poema é um gênero textual dividido em estrofes e versos. Cada estrofe é constituída por versos (não tendo um número exato) introduzidos pelo sentido das frases — e mais raramente em conversa — em que a poesia, forma de expressão estética através da língua, geralmente se manifesta.
Além dos versos, não obrigatoriamente, fazem parte da estrutura do poema as estrofes, a rima e a métrica.
Conforme a disposição dos versos e dos outros elementos estruturais, os poemas podem receber classificações ou nomes específicos (ou ser considerados gêneros literários próprios), tais como, haikai, poema-colagem, soneto, poema-dramático, poema-figurado, poesia visual, poesia concreta, epopeia, etc.
Fortemente relacionado com música, beleza e arte, o poema tem as suas raízes históricas nas letras de acompanhamento de peças musicais. Até a Idade Média, os poemas eram cantados. Só depois o texto foi separado do acompanhamento musical. Tal como na música, o ritmo tem uma grande importância.
Diferencia-se poema, gênero textual em verso em que na maioria das vezes há poesia, de poesia, que são frases que emocionam, tocam a sensibilidade e sugerem emoções por meio de uma linguagem.
Na Grécia Antiga, o poema foi a forma predominante de literatura. Os três gêneros (lírico, dramático e épico) eram escritos em forma de poesia. A narrativa, entretanto, foi ganhando importância, ficando a poesia mais relacionada com o gênero lírico.
A poesia tinha uma forma fixa: seus versos eram metrificados, isto é, observavam os acentos, a contagem silábica, o ritmo e as rimas. A contagem silábica dos versos foi sempre muito valorizada até o início do século XX, quando a obra que não se encaixasse nas normas de metrificação não era considerada poesia. Isto mudou com a influência do Modernismo, movimento cultural surgido na Europa que buscava ruptura com o classicismo. Atualmente o ritmo dos versos foi “liberado” e temos os chamados “versos livres” que não seguem nenhuma métrica, ainda que repousem sobre um determinado ritmo.
O poema tem suas personagens, que permitem supor não necessariamente representarem a verdadeira face do poeta (ou do escritor). De modo que, se há personagens, narração, conflitos internos, etc., podemos dizer que o poema é ficção — assim como a crônica, o conto, a novela, o romance, etc.
Na terceira acepção do verbete “escrever” do dicionário Michaelis, temos que escrever “é compor ou redigir um trabalho literário ou científico, artigo jornalístico, etc.”.
No dicionário Houaiss, há quinze significados para o verbete escrever; no terceiro deles, diz que “escrever é compor trabalho literário, científico, etc.”. E no décimo quarto, ele diz: “escrever é exercer o ofício de escritor (arte)”.
De tal sorte que se um sujeito escrever um único poema ficcional considerado de ‘boa’ qualidade pela crítica literária comprometida com as funções reais da literatura poderá ser tido por escritor; em contrapartida, se um sujeito escrever mil poemas de uma qualidade que avilte o gênero, poderá não ser considerado escritor pela mesma crítica, mas apenas um sujeito que escreve, como o elefante e sua tromba, e o infante e seu brinquedo de escrever.
In: CASTRO, João Rosa de. Fogo Fátuo. 1ª ed. São Paulo: autopublicação, 2024. Disponível em <https://clubedeautores.com.br/books/search?where=books&what=fogo+f%C3%A1tuo>
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