O Arauto quase teve outros dois títulos, um deles ambíguo. Mas, como a arte em si é polissêmica, não há porque não confundir o nome das crianças e das obras de arte.
Fala em equilíbrio, em uma esperança que nem aumenta nem diminui o suplício. Mas uma esperança que move para o ato, para a ação, para o sentir-se ativo, agente e autor da própria vida.
Pede, do começo ao fim, e a quem quer que ouça, a purificação, a cristalização do mundo, a clareza da própria obscuridade, a purificação do absurdo, e, talvez, o obscurecimento do translúcido, numa urgência de movimentos que não importa quais sejam, desde que sejam movimentos.
Observa que as paisagens se compõem em si mesmas. Os rios se encontram e se comunicam, as águas chegam ao mar. O mundo é um só e estamos todos nele e por ele ligados.
Usa linguagem formal ao lado de gírias, como em: “Vós coniventes e inversos: nóias ou anjos-da-guarda?”, e a ligação de lugares distantes, como em “E a Indonésia e a Líbia sopram vulcões da Islândia.”.
É, portanto, obra de arte repleta de movimentos e imagens transcendentais, que me traz muito orgulho por havê-la criado e teria me deixado menor se não o tivesse feito.
Com o Cio da Pedra, eu me despedia da vida em família, me despedia dos trabalhadores braçais, dos comerciantes, etc., para me dedicar às letras. Mal sabia que estava sendo mais um “Oi” do que um “Tchau” a todos eles.
A pedra faz referência às pedras de Pedro, meu falecido avô paterno: feiticeiro, que mantinha pedras pretas enormes em seu congá, nas quais os umbandistas presentes haviam de bater a cabeça antes de começarem as giras.
O cio indicava que a pedra (ou Pedro?) me invocava. A partir de então (início do curso de letras), eu partia para o mais distante. Como de fato parti, ainda que me mantive presente de outras formas.
O centro do livro é dividido com oito poemas dedicados aos filhos de meus pais. Cada um recebe o nome de um fenômeno natural. Assim que temos o arco-íris, a chama, a neblina, a chuva e o outono, o inverno, a primavera e o verão. Todos inspirados em cada um de nós, filhos de meus pais.
A partir deste livro, eu sempre tinha a impressão de que não teria mais tempo ou oportunidade de escrever poesia ou, muito menos, prosa. Parecia que algo ia me limitar os movimentos: quer fosse a morte, ou a dispersão total.
Mesmo assim, continuo escrevendo, traduzindo e promovendo a minha obra. Tomo-a por essencial, como se produzisse o pão, o cuscuz, o inhame ou a tapioca de cada dia ou como se destilasse a cachaça de cada noite. Não pode faltar no café da manhã para inspirar o dia nem para esquecer as inquietações da noite.
Zum forma com Bis uma palavra que me é muito cara: Zumbis. Imagine se cada um de nós fosse um Zumbi dos Palmares? Libertários como ele! Ou se fôssemos zumbis em outro sentido?
O livro traz o primado da criação. Inicia com o poema “Produção Independente”. A escravidão de si mesmo. A mais acertada. A mais democrática das escravidões. O escravo de si mesmo não escraviza ninguém nem se deixa escravizar por ninguém ao mesmo tempo que escraviza a todos e se deixa escravizar por todos. Ninguém mais que Zumbi para ter pensado em algo como isto.
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R$ 70,00Preço
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