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Fogo Fátuo: matemática artesanal

  • Foto do escritor: João Rosa de Castro
    João Rosa de Castro
  • 14 de out.
  • 2 min de leitura
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Talvez a física desminta as mentiras que a matemática nos dá a oportunidade de dissecar. E falamos em oportunidade, porque é difícil lidar com algo que se propõe a comparar e a nos levar a comparar, seja em termos de quantidade, seja de qualidade. Que nada é igual a nada. Que tudo difere de tudo, seja na quantidade, seja na qualidade ou em ambas. Ainda é possível que um mais um somem dois. Difícil é imaginar um se tornando dois ou dois se tornando quatro, conforme Dostoievski já denunciava.

Até mesmo gêmeos são diferentes em relação a sua duração se analisarmos a quantidade de tempo de sua existência. E mesmo que nasçam juntos; de algum modo, terão iniciado a sua formação em tempos diversos.

A dança é uma arte que ajuda a matemática a lidar com suas controvérsias. Porque os movimentos alcançados supostamente ao mesmo tempo pelos dançarinos fazem com que seja possível haver alguma igualdade no reino da terra.

Quanto ao mais, os objetos apresentam diferenças, principalmente em relação ao que alguns chamam de “quarta dimensão”, que alguns dizem ser a duração. Além disso, se Sartre dizia que “não havia harmonia entre dois seres”, asseveramos que não há nem harmonia nem igualdade entre dois seres. Quanto à harmonia, negada por Sartre, estão aí as orquestras sinfônicas para lhe dizer o contrário. Não sabemos se podem dizer que há igualdade tanto quanto os bailarinos.

Posto o quê, tentemos, mais uma vez, problematizar a democratização como um recurso de gente bondosa. Todos somos iguais perante a lei, apenas porque somos bondosos. Se não o fôssemos, enfrentaríamos a realidade que a física comprova: ninguém é igual a ninguém, nada é igual a nada, não se ocupa o mesmo espaço ao mesmo tempo, etc., e isto poderia levar aos privilégios, às regalias de quem tem mais “lastro”, e haveríamos de repetir a revolução francesa numa escala universal.

O filósofo dizia que a natureza tem esta falha: “quem tem aquele tal daquele ‘lastro’ (ou um conhecimento fenomenal) poderia carregar na testa uma luz a mais perante todos” para não correr o risco de ser tratado nem sequer “comparado” com quem não “o” tem.

Sobretudo porque a comparação sempre traz um ódio a mais, e, nos processos de democratização, não fazemos senão comparar e nos imiscuirmos nos bolsos alheios, quais ladravazes. De maneira que criamos um espaço cada vez mais odioso em que podemos ou tentamos nos movimentar.


[CASTRO, João Rosa de. Fogo Fátuo. 1ª edição. São Paulo: Clube de Autores, 2024. Disponível em https://clubedeautores.com.br/livro/fogo-fatuo].

 
 
 

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